Pedro José Labronici, Saulo Santos Blunck, Flavius Ribeiro Lana, Bruno Bandeira Esteves, José Sergio Franco, Junji Miller Fukuyama, Robinson Esteves S
VITAMINA D E SUA RELAÇÃO COM A DENSIDADE MINERAL ÓSSEA EM MULHERES NA PÓSMENOPAUSA
Pedro José Labronici, Saulo Santos Blunck, Flavius Ribeiro Lana, Bruno Bandeira Esteves, José Sergio Franco, Junji Miller Fukuyama, Robinson Esteves Santos Pires
Rev Bras Ortop. 2013;48(3):228-235
Resumo Objetivo: Comparar o nível de vitamina D com a densidade mineral óssea (DMO) em mulheres na pós-menopausa, com ou sem fraturas. Métodos: Foram avaliadas 250 mulheres com idade média de 71,1 anos. Os níveis séricos de vitamina D foram considerados normais quando = 30 ng/mL, insuficientes entre 20 e 30 ng/mL e deficientes < 20 ng/mL. A DMO foi medida e considerada osteopenia quando o valor total T da coluna lombar ou do quadril estava entre -1 e -2,5 e osteoporose quando < -2,5. As pacientes com fratura somavam 25,2%. Resultados: Não existiu diferença significativa na dosagem de vitamina D (ng/mL) entre as faixas etárias (p = 0,25), os níveis de fratura (p = 0,79) e os níveis da DMO (p = 0,76). Conclusão: Das pacientes, 82% apresentaram níveis séricos de vitamina D deficientes e insuficientes. Nossos resultados não demonstraram correlação significativa entre os níveis de vitamina D e DMO com a idade.. Descritores - Vitamina D Osteoporose Densidade óssea Fraturas ósseas |
1Doutor em Medicina pela Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo; Chefe de Clínica do Serviço de Ortopedia e Traumatologia do Prof. Dr. Donato D'Ângelo, Hospital Santa Teresa, Petrópolis, RJ, Brasil.
INTRODUÇÃO A perda da densidade óssea em mulheres na pós-menopausa está relacionada a uma deficiência subclínica de vitamina D, o que é considerado fator de risco, por causa da suscetibilidade a quedas e da inadequada resposta neuromuscular.1-4 A insuficiência de vitamina D pode ocorrer por deficiência nutricional e/ou por baixa exposição à luz solar em pacientes idosos confinados e também em pacientes internados com doenças crônicas.5-8 Estudos demonstram que a ingestão de cálcio está associada à elevada densidade mineral óssea, quando comparada com a massa óssea das pacientes com baixa ingestão. Os benefícios do suplemento com vitamina D e cálcio na prevenção da perda óssea são: diminuição da renovação óssea e do número de fraturas não vertebrais.9 A suplementação com vitamina D em combinação com cálcio (500-1.200 mg/d) parece reduzir o hiperparatireoidismo secundário associado à insuficiência de vitamina D.10 A vitamina D é absorvida por dois mecanismos: ativação da 7-dehidrocolesterol pela luz solar na pele e absorção intestinal por fontes alimentares. O nível sérico adequado de vitamina D é de aproximadamente 30 a 55 ng/mL. Valores abaixo de 20 ng/mL são considerados deficientes e uma variação entre 20 e 30 ng/mL é considerada inadequada.11,12 O objetivo deste trabalho foi comparar o nível da vitamina D com a DMO em mulheres na pós-menopausa, com ou sem fraturas. Material e métodos Entre janeiro de 2010 a dezembro de 2011 foram avaliadas 250 mulheres com idade média de 71,1 anos (45 a 98). Os fatores de inclusão foram: mulheres que já se encontravam na pós-menopausa havia pelo menos dois anos e que apresentavam densitometria óssea recente, de pelo menos seis meses antes da consulta, exame com a dosagem de vitamina D e não usavam corticosteroide. Os níveis séricos de vitamina D foram medidos por meio de eletroquimioluminescência e foram considerados normais quando = 30 ng/mL, insuficientes entre 20 e 30 ng/mL e deficientes < 20 ng/mL. A DMO foi medida com o uso do Densitômetro Lunar Prodigy Advance com tecnologia fan bean da GE®, na região do quadril e na coluna lombar. A densitometria do quadril incluiu o trocanter, colo do fêmur e a região intertrocantérica. A densitometria na coluna lombar incluiu as vértebras lombares de L1 - L4. Os valores de T e Z foram calculados pelo software com valores de referência Norte-Americano. Foi considerada osteopenia quando o valor total T da coluna lombar ou do quadril estava entre -1 e -2,5 e osteoporose quando < -2,5. A caracterização da amostra teve como finalidade traçar um perfil geral das 250 pacientes em estudo. A Tabela 1 fornece a média, o desvio padrão (DP), a mediana, o mínimo e o máximo das variáveis numéricas e a Tabela 2 fornece a frequência (n) e o percentual (%) das variáveis categóricas. Metodologia estatística A análise descritiva apresentou sob forma de tabela os dados observados, expressos pela frequência (n) e pelo percentual (%) para dados categóricos (qualitativos) e pela média, pelo desvio padrão, pela mediana, pelo mínimo e máximo para dados numéricos. A análise estatística foi composta pelos seguintes métodos: - a comparação das variáveis numéricas entre dois subgrupos foi analisada pelo teste t de Student para amostras independentes ou pelo de Mann-Whitney e para comparações entre três subgrupos foi usada a ANOVA one-way ou a Anova de Kruskal-Wallis (não paramétrica). Testes de comparações múltiplas de Tukey ou de Dunn (não paramétrico) foram aplicados para identificar quais as categorias que diferem significativamente entre si, ao nível de 5%; e Foram aplicados testes não paramétricos, pois algumas variáveis não apresentaram distribuição normal (Gaussiana), por causa da dispersão dos dados e da rejeição da hipótese de normalidade segundo o teste de Kolmogorov-Smirnov. O critério de determinação de significância adotado foi o nível de 5%. A análise estatística foi processada pelo software SAS 6.11 (SAS Institute, Inc., Cary, North Carolina, EUA). Resultados O primeiro objetivo foi verificar se existia diferença significativa na idade média (em anos) entre os níveis de fratura (presente e ausente), de vitamina D (deficiente, insuficiente e suficiente) e da DMO (normal, osteopenia e osteoporose). A Tabela 3 fornece a média ± desvio padrão (DP) da idade segundo os níveis de fratura, vitamina D e DMO e o correspondente nível descritivo (p valor) do teste estatístico. A análise estatística foi composta pelo teste t de Student para amostras independentes para comparação ente duas categorias (níveis) ou pela Anova one-way para comparação entre três categorias. O teste de comparações múltiplas de Tukey foi aplicado para identificar quais as categorias que diferiam significativamente entre si, ao nível de 5%. Observou-se que o subgrupo das pacientes com fratura apresentava idade média significativamente maior do que o subgrupo sem fratura (p = 0,0002) e uma diferença significativa na idade média entre os níveis da DMO (p = 0,0001). Segundo o teste de Tukey, ao nível de 5%, identificou-se que o subgrupo das pacientes com osteoporose apresentava idade média significativamente maior do que os subgrupos com DMO normal e osteopenia. Não existiu diferença significativa na idade média entre os níveis de vitamina D (p = 0,13). O segundo objetivo foi verificar se existia diferença significativa na dosagem de vitamina D (em ng/mL) entre as faixas etárias, níveis de fratura e da DMO. A Tabela 4 fornece a mediana, o mínimo e o máximo da vitamina D (ng/mL) segundo as faixas etárias (45 a 59, 60 a 69, 70 a 79 e 80 a 99 anos), níveis de fratura (presente e ausente) e DMO (normal, osteopenia e osteoporose) e o correspondente nível descritivo (p valor) do teste estatístico. A análise estatística foi composta pelo teste de Mann- Whitney para comparação entre duas categorias (níveis) ou pela Anova de Kruskal-Wallis para comparação entre três categorias. O teste de comparações múltiplas de Dunn foi aplicado para identificar quais as categorias que diferem significativamente entre si, ao nível de 5%. Verificou-se que não existia diferença significativa na dosagem de vitamina D (ng/mL) entre as faixas etárias (p = 0,25), níveis de fratura (p = 0,79) e níveis da DMO (p = 0,76) (Fig. 1). O terceiro objetivo foi analisar se existia associação significativa entre as variáveis: faixa etária, fratura, níveis de vitamina D e da DMO. As Tabelas 5, 6, 7 e 8 fornecem a frequência (n) e o percentual (%) das tabelas de contingência entre as quatro variáveis em estudo e o correspondente nível descritivo (p valor) do teste de ?2. As análises se repetiram, diferenciando-se apenas do ponto de vista de apresentação. Observou-se existir uma associação significativa entre faixa etária com a presença de fratura (p < 0,0001) e osteoporose (p = 0,006). Verificou-se que existia uma associação significativa entre presença de fratura com a faixa etária (p < 0,0001) e osteoporose (p = 0,011). Observou-se não existir associação significativa entre os níveis de vitamina D com faixa etária (p = 0,22), fratura (p = 0,82) e DMO (p = 0,77) (Fig. 2). Verificou-se que existia uma associação significativa entre osteoporose com faixa etária (p = 0,006) e presença de fratura (p = 0,011). Discussão A vitamina D é de relevante importância na absorção do cálcio. Quando os níveis séricos da vitamina D diminuem, o nível do paratormônio aumenta e consequentemente a absorção de cálcio diminui. A vitamina D é absorvida por dois mecanismos: ativação pela luz solar do 7-dehidrocolesterol na pele e absorção intestinal por meio de dieta. Embora a deficiência de vitamina D seja relativamente rara na população jovem saudável, é comum na população idosa, especialmente entre os pacientes internados ou moradores de países onde a luz solar é limitada.12 Vale a pena ressaltar que a deficiência da vitamina D não está limitada somente aos ossos ou aos músculos. Recentes dados epidemiológicos sobre a deficiência da vitamina D demonstraram associação com artrites, como também doenças não esqueléticas, tais como: câncer de próstata, colo e mama; diabetes tipo 1 e 2; esclerose múltipla; hipertensão; doença cardiovascular e esquizofrenia.11 Este estudo analisou a relação entre os níveis de vitamina D e a idade e não encontrou diferença estatística. Porém, ao analisar as pacientes com níveis deficientes e insuficientes, observamos um valor maior de 70% em todas as faixas etárias. Portanto, é aconselhável medir os níveis séricos de vitamina D, independentemente da idade, pois níveis deficientes e insuficientes podem acelerar a deterioração óssea e levar à osteoporose. A relação entre a vitamina D e a densidade mineral óssea ainda está em discussão. Uma avaliação do nível de vitamina D em pacientes com osteoporose é essencial por duas razões. A primeira porque a deficiência de vitamina D causa uma desmineralização que pode levar uma diminuição da massa óssea.13,14 A segunda porque é importante conseguir níveis ideais de vitamina D em pacientes com osteoporose, para maximizar a resposta da terapia antirreabsortiva, facilitar mudanças na densidade mineral óssea e conseguir eficácia contra as fraturas.15 Vários estudos sugerem que nível sérico baixo de vitamina D está associado à densidade mineral óssea baixa.16-18 Bischoff-Ferrari et al.19 demonstraram uma relação extremamente positiva entre a vitamina D e a densidade mineral óssea entre jovens brancos e homens idosos. Entretanto, essa associação não tem sido encontrada em outros estudos.20-22 A heterogeneidade dos resultados entre os níveis de vitamina D e da densidade mineral óssea pode ser parcialmente explicada pela diferença étnica da população e dos grupos etários e pela pesquisa em diferentes regiões do corpo humano. Garnero et al.23 e Allali et al.24 não conseguiram mostrar correlação significativa entre os níveis de vitamina D e densidade mineral óssea com a idade. Rassouli et al.25 encontraram uma correlação da densidade mineral óssea na coluna, mas não no quadril. Sadat-Ali et al.26 demonstraram que a maioria dos pacientes com insuficiência de vitamina D tinha massa óssea baixa, enquanto que 100% dos pacientes com deficiência de vitamina D tinham densidade mineral óssea que variava entre a osteopenia e a osteoporose. Também demonstraram uma correlação entre níveis de vitamina D e densidade mineral óssea na maioria dos pacientes, particularmente nos grupos com insuficiência e deficiência. Enfatizaram a importância de medir os níveis de vitamina D em pacientes com massa óssea baixa, em vez de confiar somente na densitometria óssea. Bandeira et al.27 encontraram uma grande deficiência de vitamina D em mulheres saudáveis na pós-menopausa, independentemente da idade, avaliadas na consulta de rotina. Concluíram que pacientes com níveis abaixo de 25 ng/mL eram idosas, que se encontravam havia muito tempo na menopausa e tinham densidade mineral óssea significativamente baixa no colo do fêmur e com altos níveis de paratormônio. Este estudo demonstrou que 91,1% das pacientes com osteopenia apresentavam níveis séricos de vitamina D deficientes e insuficientes (41,5% e 49,6%, respectivamente) e que 62,5% das pacientes com osteoporose apresentavam níveis séricos de vitamina D deficientes e insuficientes (31,9% e 30,6%, respectivamente). Entretanto, 46,4% das pacientes normais apresentavam níveis séricos de vitamina D deficientes e insuficientes (26,6% e 19,8%, respectivamente). Cabe ressaltar que todas as mulheres eram da mesma região (latitude e altitude) e da etnia branca. Evidências recentes mostram que exposição ao sol não garante níveis saudáveis de vitamina D. Brinkley et al.28 avaliaram 93 adultos jovens no Havaí que ficavam expostos ao sol, sem proteção, por mais de 20 horas por semana, e relataram que 51% apresentavam níveis inadequados de vitamina D (< 30 ng/mL). No Brasil, por ser um país tipicamente tropical, devia esperar-se a presença de uma quantidade adequada de vitamina D na população. Entretanto, em dois estudos feitos em pacientes idosos no sudoeste do país (latitude 20-30°S) ficou demonstrado grande predomínio de deficiência de vitamina D.29-32 A deficiência de vitamina D está presente em todas as regiões, mas é maior no sul da Ásia e no Oriente Médio.33 Em nosso estudo foram analisadas mulheres a partir de dois anos após a menopausa, todas da etnia branca e bem nutridas que residiam na mesma região com uma latitude de 22° 30' 16.70"S, longitude de 43° 10' 56.38"W, clima tropical de altitude e em uma cidade localizada a 838 metros do nível do mar. Os resultados obtidos demonstraram que 37,6% das pacientes apresentavam níveis séricos de vitamina D deficientes. Porém, agrupando os pacientes com níveis séricos de vitamina D insuficientes e deficientes, o valor alcançado foi de 82%. Nos Estados Unidos da América os resultados da National Health and Nutrition Examination Survey encontraram índices de vitamina D deficientes em 30% dos pacientes e o total de insuficientes e deficientes foi de 70%.34 Patton et al.35 relataram que, independentemente dos valores de corte, os níveis se encontravam relativamente baixos nas mulheres quando comparados com os dos homens e em população hispânica e negra quando comparadas com a branca. Hipovitaminose D tem sido identificada nos pacientes com patologias ortopédicas, principalmente fraturas. Vários autores relataram insuficiência de vitamina D após procedimentos ortopédicos, com variação de 15 a 24%.36,37 Em uma série de pacientes na Austrália com fratura do quadril, aproximadamente 80% apresentavam vitamina D insuficiente e mais de 30% hiperparatireoidismo secundário.38 Neste estudo, apesar de o resultado estatístico não ser significativo, 42,9% dos pacientes com fraturas apresentaram insuficiência de vitamina D. Convém ressaltar que o aspecto negativo deste trabalho foi a ausência da pesquisa do paratormônio, que, estimulado pela deficiência de vitamina D, poderia interferir na densidade óssea (hiperparatireoidismo secundário) e levar a uma osteoporose. Tampouco foi considerado o peso das pacientes.. Conclusão Apesar de este estudo ter sido feito em uma região de clima tropical de altitude, 82% das pacientes apresentaram níveis séricos de vitamina D deficientes e insuficientes. Nossos resultados não demonstraram correlação significativa entre os níveis de vitamina D e densidade mineral óssea com a idade. Conflitos de interesse Os autores declaram inexistência de conflitos de interesses na feitura deste trabalho. REFERÊNCIAS
1. Cumming RG, Klineberg RJ. Case-control study of risk factors for hip fractures in the elderly. Am J Epidemiol. 1994;139(4):493-503. |